Texto e Fotografias de Mônica Yamagawa


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Livro: História do vestuário no ocidente

História do Vestuário no Ocidente

François Boucher
Cosac Naify 
2010

François Boucher explora a trajetória do vestuário e da pré-história, passando pelo Antigo Oriente e Europa pré-cristã, até chegar ao final do século XX. O autor detalha as principais mudanças nas silhuetas, os materiais em voga em cada época e a evolução das modelagens...[+]

 


E-book

Upholstery Conservation: Principles and Practice

Dinah Eastop
Kathryn Gill
Taylor and Francis

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PATRIMÔNIO CULTURAL

CULTURA MATERIAL EM AÇÃO:

CONSERVAÇÃO DE VESTUÁRIOS

OCULTADOS NO CENTRO DE

EDIFICAÇÕES

tradução do texto de de Dinah Eastop

atualizado em: 20 de julho de 2016

 

home > patrimônio cultural > CULTURA MATERIAL EM AÇÃO

Tradução de Mônica Yamagawa do artigo: EASTOP, Dinah. “Material culture in action: conservin garments deliberately concealed within buildings”. IN: Anais do Museu Paulista. São Paulo: vol. 15, n.1, p. 187-204, jan-jun. 2007.

 

1. Introdução

Este artigo discute sobre como a compreensão da idéia de “cultura material” pode auxiliar no esclarecimento, na prática e na ética de dilemas, tanto na curadoria, como na conservação de artefatos têxteis. A cultura material está relacionada com os significados dos objetos, com a busca da compreensão de suas relações com os indivíduos, seja no passado e no presente, nas sociedades urbanas e industrializadas ou nos pequenos grupos sociais ao redor do mundo. A expressão na língua inglesa “matter” abrange duas conotações importantes. Primeiro, como substantivo, significa matéria, substância, referindo-se, por exemplo, ao estado físico do objeto e seus os três estados - “as three states of matter” - (sólido, líquido e gasoso). E, em um segundo momento, a expressão utilizada como verbo (importar, significar), referindo-se à sua importância, valor ou seu significado. O estudo da cultura material foca-se na integração dos dois aspectos do objeto: físico e simbólico.

Nas pesquisas sobre cultural material, o foco no papel social do artefato direciona os estudos para a análise dos materiais, da tecnologia utilizada em sua produção e na circunstância, ou seja, na razão de sua fabricação (produção), seus usos (geralmente referido como “consumo”, nos estudos de cultura material) e sua disposição, exposição. Medidas tomadas para assegurar a preservação de um artefato podem ser visualizadas em vários estágios: produção (no sentido de representar / apresentá-lo de uma forma diferente), consumo (utilização de uma nova maneira) ou como uma forma de exibição/disposição (se o pesquisador enxerga museus como locais de exibição em detrimento dos estágios de produção e do consumo, mencionados).

A razão de o artefato possuir importância e significado exige uma compreensão de como e porque razões indivíduos atribuem valores para os objetos. A compreensão desse processo é complementada através da observação sobre o que os indivíduos declaram e escrevem. Para entender os motivos pelos quais objetos são importantes para as pessoas, é necessário que o valor, a importância (geralmente a propriedade simbólica do objeto) seja expressa através de algum tipo de linguagem, oral ou impressa. A explicação da importância atribuída da linguagem para o pesquisador responsável pela análise da cultura material pode ser compreendida através da interação entre artefato (objeto), sujeito (indivíduo) e linguagem (metáfora). Este artigo apresenta um exemplo de conservação de artefato têxtil para ilustrar a cultura material “em ação”, através da análise dos desafios encontrados para a preservação de um grupo especial de artefato têxtil: peças de vestuários ocultados, propositalmente, dentro de edificações.

 

2. “The Deliberately Concealed Garments Project - DCGP” (Projeto dos Vestuários Propositalmente Ocultados)

Há uma antiga prática, porém, raramente registrada no Reino Unido (e em várias outras localidades) de ocultar, propositalmente, vestimentas (e outros pertences) nas estruturas das edificações. Tais ocultações (conhecidas como “caches” – esconderijo, armazém - expressão de origem francesa para “esconder”) podem consistir de um item (como uma garrafa ou um sapato) ou de vários itens escondidos juntos. Por exemplo, um esconderijo encontrado dentro de uma cavidade na parede coberta por trepadeiras em uma residência revestida em madeira em Abington, Oxfordshire, Reino Unido, consistia de uma bolsa com cordão datada por volta de 1740, um capuz de criança datado de 1740-1770, fragmentos de documentos comerciais, além de promissórias (cartas de câmbio) e moedas com datas de 1573-1577 e 1797. Coleções de objetos de diferentes datas são comuns, o que dificulta afirmar quando esses esconderijos foram depositados ou se foram ocultados juntos em um mesmo momento, ou os itens foram adicionados, separadamente, com o passar dos tempos.

Os lugares comuns de ocultação incluem pontos de entradas (como calçadas que levam até portas, aberturas de janelas e chaminés) e em espaços vazios, vãos (como debaixo de assoalhos e em gavetas de fornos). A prática é também registrada no Norte da Europa, na América do Norte e na Austrália. A razão ou as razões para a ocultação não são específicas, porém, alguns pesquisadores, exploradores atribuem a função de proteção para tais práticas.

Em 1998, a autora iniciou um projeto, conhecido como “The Deliberately Concealed Garments Project - DCGP” (Projeto dos Vestuários Propositalmente Ocultados), para localizar, documentar e pesquisar vestimentas e outros itens descobertos, com essas características, ou seja, ocultados, escondidos dentro das edificações. O projeto DCGP construiu um trabalho pioneiro dentro do Northampton Museum and Gardens, onde June Swann começou a indexar as botas e sapatos encontrados escondidos nas estruturas de edificações. Esconderijos desse tipo têm preservado itens importantes para a história do vestuário, incluindo roupas de uso diário do século 17, como a jaqueta de linho encontrada em Reigate, Surrey e o par de espartilhos encontrados em Sittingbourne, Kent, ambos no Reino Unido.

O objetivo do projeto DCGP é prevenir o dano, a perda dos artefatos, de suas informações e sobre a prática de ocultação dos mesmos. Os dois focos principais são, consequentemente, coletar informações, dados, sobre os objetos e sobre a prática de ocultação; ampliar o número de descobertas registradas e reduzir o risco de perda ou dano, divulgando e tornando o público consciente dessa prática e da importância dos significados dos objetos escondidos.

 

3. As descobertas dos esconderijos como um desafio à preservação

As peças encontradas dentro das edificações são desafios à preservação, dadas as circunstâncias, tanto de sua ocultação, como de sua descoberta. Esconderijos, raramente, são descobertas durante projetos arquitetônicos ou escavações arqueológicas, mas, geralmente, durante obras de restauro ou reformas (reparos e manutenções), às vezes, nas atividades de demolições. O que é preservado (e como é preservado) depende da opinião dos exploradores (descobridores), curadores e conservador, o que estes acham importante, de valor.

Descobertas podem ser vistas como entulho e jogadas fora ou destruídas. Por exemplo, um sapato e um tipo de espartilho, encontrado na edificação em Saltville, Virginia, USA, foi queimado pela proprietária da residência, pois, esta pensava que não havia nenhum significado para a existência dos mesmos. No caso do esconderijo descoberto em Cuckfield, Sussex, Reino Unido, alguns itens foram perdidos entre a descoberta e a entrega para o museu local. O espartilho, encontrado com as garrafas, os pedaços de brinquedos, sapatos e outras vestimentas, foi considerado por demais danificado para ser de interesse e foi jogado fora. Os esconderijos de Saltville e Cuckfield demonstram a vulnerabilidade, o perigo de destruição (a queima do espartilho como objeto) e a retenção parcial (manter os sapatos e peças de brinquedos e jogar fora o espartilho).

Documentação parcial e retenção de descobertas são característicos, freqüentes, enquanto o registro e preservação dos itens completos dos esconderijos, ainda são raros. Exceções no Reino Unido incluem os esconderijos de Nether Wallop e Brixham, onde as localizações dos esconderijos foram fotografadas e os relatos orais dos exploradores / descobridores registrados, assim como os detalhes das descobertas. No caso de Brixham, o construtor local descobriu dois esconderijos enquanto reformava a casa em Devon. Eles foram encontrados entre as palhas utilizadas para isolação, atrás dos painéis de madeira do século 17, em um dos corredores de passagem da residência. Um dos esconderijos consistia em um fragmento de um par de culatras, tipo de calças do século 17 e um avental de linho amarrado junto à palha, na parte de cima da porta da frente da casa. O outro foi encontrado em cima da porta principal da passagem em direção ao quarto principal, era um grupo de pequenos itens, incluindo uma chave de metal, uma isca de peixe amarrada a uma corda e um osso de animal.

A retenção seletiva, a coleção, das descobertas surgem com mais frequência. Um construtor que descobriu um variado esconderijo e que colecionava garrafas antigas pode ter mantido as peças encontradas, mas dispensou os outros itens os quais não havia interesse de sua parte. Esconderijos descobertos podem ser divididos de acordo com os procedimentos e regras de aquisição de museus. Por exemplo, muitas botas e sapatos encontrados podem ser preservados e registrados, individualmente, no Reino Unido porque eles são registrados como botas e sapatos britânicos nacionais da coleção em Northhampton.

Algumas descobertas são destinadas para instituições de proteção (patrimônio). Alguns proprietários ou exploradores veem os objetos encontrados como amuletos de boa sorte ou para prevenir, proteger de má sorte e insistirão em re-escondê-los. Alguns farão uma substituição, ocultando um item novo no lugar do antigo: “Nós pretendemos repor a coleção (três sapatos e outras descobertas) com uma peça moderna (sapato) antes das “peças do esconderijo” deixar a casa. Como garantia!”.

Os desafios éticos e práticos da conservação das vestimentas que foram ocultadas, propositalmente, nas edificações fornecem uma amostra importante sobre o artefato têxtil, tanto fisicamente como simbolicamente. Essas diferenças são reveladas no percurso de conservação, quando esta é analisada como um processo de investigação, preservação e apresentação (divulgação). A seguir, um breve estudo de caso demonstra as etapas de tratamento e mostra como as decisões curatoriais e de conservação tem uma grande influência em como as vestimentas escondidas serão tratadas e exibidas.

 

4. Estudos de casos

Cada intervenção tende a priorizar um aspecto da preservação (por exemplo, preservar a evidência do esconderijo por ele mesmo, ou preservar a evidência do uso de um objeto como vestimenta ou como motivo de ocultação/esconderijo, ou preservar a evidência do objeto como sua forma original de produção). A escala de intervenção-conservação inclui a elaboração de armazenagem e disposição / apresentação; mínima intervenção e produção de réplicas; e outros tratamentos de intervenção.

Documentação, registro detalhado e investigação de materiais e construção, somados a elaboração de uma embalagem de proteção, foi a estratégia adotada para a conservação de um tipo de cinto-espartilho (vestimenta usadas por mulheres na metade do século 18) encontrado no esconderijo de Nether Wallop, Hampshire, UK. Análise detalhada mostrou que o cinto-espartilho tinha iniciado sua “vida” como um espartilho, o qual foi cortado e transformado em cinto-espartilho. O cinto-espartilho tinha muitas marcas de uso, reparo pelo qual foi pré-datado com relação ao seu esconderijo ao longo da chaminé construída no tubo de madeira da casa. A decisão foi tomada para preservar todas as evidências da complexa história de produção e consumo (uso) do cinto-espartilho. A peça foi submetida a exame detalhado e registro, porém, sem intervenção. Radiografias foram utilizadas para documentar a estrutura interna e os componentes da vestimenta, reforçada com tiras de osso de baleia. Com o consentimento do proprietário, uma amostra do osso da baleia foi removida para exame de DNA, o qual mostrou que a baleia era do Atlântico Norte, próxima a Eubalaena glacialis e de um grupo anterior, sem registro de linhagem mitocondrial de espécie.

No caso da jaqueta do início do século 17, encontrada no esconderijo de Reigate, a decisão foi pela evidência completa de seu uso do ponto da descoberta. Neste caso, o contexto do esconderijo (sua difícil dobra, enrugamento) bem como o contexto de seu pré-esconderijo (sinais no colarinho e nas mangas) foi considerado importante e a limpeza da jaqueta ficou restrita à remoção da contaminação da pós-descoberta. Nenhuma ação foi realizada para remover o amassado, o enrugamento, a sujeira no estado de pré-descoberta. Uma réplica da jaqueta foi produzida para exibição junto com o original para mostrar como o fragmento da vestimenta poderia parecer como quando era nova.

O tratamento de conservação selecionado para a bolsa com cordão e o capuz de bebê encontrados na cavidade do esconderijo de Abigdon, priorizou a preservação da produção, da manufatura do artefato e aparência original, em detrimento do seu subseqüente uso como peça de esconderijo. Pesquisas mostraram que o tecido impresso da bolsa era um raro exemplo de um tipo barato, muito comum de bolsa com cordão, popular no Reino Unido no século 18. Foi decidido seguir com um tratamento de limpeza úmida no qual reduzia a sujeira que distorcia o formato da bolsa e amassava o tecido. A limpeza úmida melhorou a aparência da bolsa, reduzindo em muito as dobras e a sujeira, facilitando a visualização do formato original da bolsa. A redução das dobras, amassados, facilitou a aplicação de costura de auxílio para a parte frágil, rasgada da peça. O tratamento de conservação possibilitou a exibição da bolsa de uma maneira aproximada à de um exemplar “novo”. Preservar a evidência de sua produção foi privilegiado em detrimento de reter a evidência de seu uso posterior como parte do esconderijo.

 

5. Estendendo os limites da conservação

A estratégia de conservação DCGP não ficou limitada a um tipo de investigação e intervenção como pôde ser observado acima, o mesmo para as medidas de conservação preventiva (conselhos fornecidos através do website da DCGP). Ampliar o conhecimento público da prática de esconderijo a sua importância histórica da descoberta é parte significante do DCGP, pois, a falta de conhecimento sobre os esconderijos contribui para sua perda e dano. Várias “medidas intermediárias” foram feitas para provocar no público, o interesse e a compreensão sobre os esconderijos encontrados, incluindo a elaboração de artigos tanto nas publicações especializadas, acadêmicas, como direcionadas para a imprensa em geral, popular (como jornais locais), além da criação de um website e da organização de uma exposição rotativa.

Um programa de história oral foi iniciado como parte do DCGP para aprender mais sobre as circunstâncias da descoberta e do esconderijo, além, de mais informações sobre o ponto de vista dos descobridores, proprietários, curadores e conservadores. As gravações relativas aos esconderijos britânicos estão sendo realizadas: Brixham (2006); Nether Wallop, Reigate, Sitingbourne (2007). As mixagens são auxiliadas pela Wessex Film e Sound Archive, de Winchester, UK, onde estão acessíveis ao público.

Esconderijos frequentemente requerem a custódia, autorização do descobridor ou do proprietário da construção onde foram encontrados. Pode ser difícil obter uma clara imagem, fotografia de onde e quando os esconderijos foram encontrados, pois, os museus não podem coletar as peças completas do esconderijo, escolhendo parte para retenção considerada importante para suas coleções. O banco de dados dos esconderijos foi então estabelecido como parte do DCGP e podem ser acessados via website: www.concealedgarments.org.

O banco de dados abriga junto com as informações sobre os esconderijos no Reino Unido, uma “coleção virtual” de artefatos descobertos em terras britânicas. Os registros incluem artefatos que não estão mais acessíveis, pois foram destruídos ou re-escondidos. Os objetos estão documentados individualmente e agrupados por esconderijos. A coleção virtual permite que o número de tipos seja determinado, assim como a frequência com a qual são descobertos em uma localização em particular. Descobridores, proprietários e funcionários de museus são encorajados a registrar as descobertas via website, on-line. “Registre uma descoberta” é um link, formulário disponível no website. O website tem sido um sucesso para atrair pesquisadores e curiosos, além de informações sobre esconderijos nas edificações britânicas, suecas, norte-americanas e australianas. O website também contém uma ampla bibliografia e conselhos para descobridores sobre o que fazer quando encontrar um desses esconderijos.

Parte da estratégia do projeto de conservação do DCGP foi o desenvolvimento de uma exposição rotativa, chamada “Hidden House History” (História da Casa Escondida – História dos Esconderijos de Casas). A exposição apresentava descobertas e explorava as práticas de esconderijo. Visitantes foram convidados a registrar descobertas e para considerar as questões éticas desenvolvidas provenientes dessas descobertas, por exemplo, eles perguntavam aos visitantes, sobre o ponto de vistas deles, sobre o que deveriam acontecer com os esconderijos encontrados, após serem descobertos. A “Hidden House History” apresentava um mesmo grupo de objetos de um esconderijo e uma variedade de possibilidades. Três esconderijos eram exibidos dentro das reconstruções de suas localizações onde foram encontrados: embaixo do assoalho de madeira; no tudo da chaminé; e com a lâmina e argamassa da parede. As reconstruções foram criadas, desenvolvidas para que os descobridores pudessem com segurança encontrá-los e ao mesmo tempo evocar o senso, a sensibilidade da descoberta de objetos escondidos no escuro, em condições limitadas de pouco espaço.

Descobertas de outros esconderijos britânicos foram exibidas na forma tradicional, com bases nos procedimentos Museológicos. Fragmentadas, sujas e amassadas vestimentas eram expostas para mostrar que mesmo danificadas as descobertas podem contem considerável interesse histórico e merecem preservação. Por exemplo, o danificado cinto-espartilho de Nether Wallop foi exibido junto com os resultados de DNA analisados dos ossos de baleias das peças que o reforçavam o qual permitiram a identificação de uma antiga espécie não conhecida da linhagem de uma baleia do Atlântico North, descrita anteriormente. Isto demonstra que mesmo uma peça de vestimenta danificada e aparentemente sem valor pode ser uma fonte de informação importante de pesquisa tanto para a História como para a História Natural.

Uma similar aproximação foi adotada para a preservação e exibição dos restos de uma rara vestimenta, uma jaqueta, do século 17, encontrada em Abingdon. Os fragmentos da peça foram expostos junto com uma réplica de tamanho natural. A análise das tintas, pigmentação, revelou a presença de um tipo de índigo na parte externa da manufatura, o qual sugere que a cor original da parte externa era azul, criando um dramático contraste entre a antiga (fragmentos) e a nova (réplica), encorajando os visitantes a pensar de uma forma diferente sobre o fragmento, a descoloração da jaqueta.

 

6. Discussão

A estratégia de conservação DCGP não ficou limitada a um tipo de investigação e intervenção como pôde ser observado acima, o mesmo para as medidas de conservação preventiva (conselhos fornecidos através do website da DCGP). Ampliar o conhecimento público da prática de esconderijo a sua importância histórica da descoberta é parte significante do DCGP, pois, a falta de conhecimento sobre os esconderijos contribui para sua perda e dano. Várias “medidas intermediárias” foram feitas para provocar no público, o interesse e a compreensão sobre os esconderijos encontrados, incluindo a elaboração de artigos tanto nas publicações especializadas, acadêmicas, como direcionadas para a imprensa em geral, popular (como jornais locais), além da criação de um website e da organização de uma exposição rotativa.

Um programa de história oral foi iniciado como parte do DCGP para aprender mais sobre as circunstâncias da descoberta e do esconderijo, além, de mais informações sobre o ponto de vista dos descobridores, proprietários, curadores e conservadores. As gravações relativas aos esconderijos britânicos estão sendo realizadas: Brixham (2006); Nether Wallop, Reigate, Sitingbourne (2007). As mixagens são auxiliadas pela Wessex Film e Sound Archive, de Winchester, UK, onde estão acessíveis ao público.

Esconderijos frequentemente requerem a custódia, autorização do descobridor ou do proprietário da construção onde foram encontrados. Pode ser difícil obter uma clara imagem, fotografia de onde e quando os esconderijos foram encontrados, pois, os museus não podem coletar as peças completas do esconderijo, escolhendo parte para retenção considerada importante para suas coleções. O banco de dados dos esconderijos foi então estabelecido como parte do DCGP e podem ser acessados via website: www.concealedgarments.org.

O banco de dados abriga junto com as informações sobre os esconderijos no Reino Unido, uma “coleção virtual” de artefatos descobertos em terras britânicas. Os registros incluem artefatos que não estão mais acessíveis, pois foram destruídos ou re-escondidos. Os objetos estão documentados individualmente e agrupados por esconderijos. A coleção virtual permite que o número de tipos seja determinado, assim como a frequência com a qual são descobertos em uma localização em particular. Descobridores, proprietários e funcionários de museus são encorajados a registrar as descobertas via website, on-line. “Registre uma descoberta” é um link, formulário disponível no website. O website tem sido um sucesso para atrair pesquisadores e curiosos, além de informações sobre esconderijos nas edificações britânicas, suecas, norte-americanas e australianas. O website também contém uma ampla bibliografia e conselhos para descobridores sobre o que fazer quando encontrar um desses esconderijos.

Parte da estratégia do projeto de conservação do DCGP foi o desenvolvimento de uma exposição rotativa, chamada “Hidden House History” (História da Casa Escondida – História dos Esconderijos de Casas). A exposição apresentava descobertas e explorava as práticas de esconderijo. Visitantes foram convidados a registrar descobertas e para considerar as questões éticas desenvolvidas provenientes dessas descobertas, por exemplo, eles perguntavam aos visitantes, sobre o ponto de vistas deles, sobre o que deveriam acontecer com os esconderijos encontrados, após serem descobertos. A “Hidden House History” apresentava um mesmo grupo de objetos de um esconderijo e uma variedade de possibilidades. Três esconderijos eram exibidos dentro das reconstruções de suas localizações onde foram encontrados: embaixo do assoalho de madeira; no tudo da chaminé; e com a lâmina e argamassa da parede. As reconstruções foram criadas, desenvolvidas para que os descobridores pudessem com segurança encontrá-los e ao mesmo tempo evocar o senso, a sensibilidade da descoberta de objetos escondidos no escuro, em condições limitadas de pouco espaço.

Descobertas de outros esconderijos britânicos foram exibidas na forma tradicional, com bases nos procedimentos Museológicos. Fragmentadas, sujas e amassadas vestimentas eram expostas para mostrar que mesmo danificadas as descobertas podem contem considerável interesse histórico e merecem preservação. Por exemplo, o danificado cinto-espartilho de Nether Wallop foi exibido junto com os resultados de DNA analisados dos ossos de baleias das peças que o reforçavam o qual permitiram a identificação de uma antiga espécie não conhecida da linhagem de uma baleia do Atlântico North, descrita anteriormente. Isto demonstra que mesmo uma peça de vestimenta danificada e aparentemente sem valor pode ser uma fonte de informação importante de pesquisa tanto para a História como para a História Natural.

Uma similar aproximação foi adotada para a preservação e exibição dos restos de uma rara vestimenta, uma jaqueta, do século 17, encontrada em Abingdon. Os fragmentos da peça foram expostos junto com uma réplica de tamanho natural. A análise das tintas, pigmentação, revelou a presença de um tipo de índigo na parte externa da manufatura, o qual sugere que a cor original da parte externa era azul, criando um dramático contraste entre a antiga (fragmentos) e a nova (réplica), encorajando os visitantes a pensar de uma forma diferente sobre o fragmento, a descoloração da jaqueta.

 

7. Conclusão

O DCGP demonstra a complexa relação entre pessoas, objetos e linguagem, e a influência do papel da conservação têxtil na preservação e apresentação de certos pontos de vistas dos objetos. Este artigo argumenta que uma compreensão da “cultura material” pode auxiliar na identificação e no esclarecimento de dilemas éticos e práticos na curadoria e conservação de artefatos têxteis. Descobertas de esconderijos fornecem um excelente modelo de “cultura material” em ação, pois, destacam como a categorização das descobertas afeta o modo como esses objetos são preservador e coletados. Também apresenta a importância do efeito da avaliação sobre o que e como o objeto é preservado. Os benefícios da interdisciplinaridade e da ampliação de acesso, como consultas públicas, envolvimento da população, trabalho em conjunto com construtores podem esclarecer ainda mais o assunto. O DCGP tem-se beneficiando positivamente dessa troca de trabalhos, como a interação de pesquisas e colaboração dentro de Universidades e o trabalho em conjunto com arquivos e museus.

O DCGP tem demonstrado que a “cultura material” une três principais benefícios. Primeiro, facilita a aproximação das propriedades físicas dos objetos e de seus usos sociais. Segundo, deixa claro que “a verdadeira natureza” dos objetos varia e é determinada culturalmente, como demonstra a variedade de respostas para as descobertas das vestimentas escondidas nas edificações. Terceiro, a abordagem da cultura material tem facilitado as discussões de opções para investigação, preservação e apresentação das vestimentas escondidas.

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