De acordo com Barbui (2006), durante a construção da edificação que abrigaria a Casa Netter, de propriedade de Jacques Netter (no número 48), os empreiteiros encontraram paredes de meação dos dois lados - com o número 46, Joalheria Grumbach e com o número 50, Farmácia Normal - como obstáculo para seu projeto:
"Quando da construção de um edifício para a Casa Netter, no. 48 da rua 15 de Novembro, na última quadra em direção ao largo do Rosário (praça Antônio Prado), os empreiteiros Rossi & Brenni haviam tido dificuldades para fazer as fundações da obra por encontrarem, em ambos os lados, paredes dde meação: (...) 'o qual muro é de meação e de taipa até o 1o. andar, sendo o muro do sobrado construído sobre o dito de taipa, e feito em condições de não admitir o corte da mesma na parte que pertence ao prédio a construir-se, causa recear-se o desmoronamento do prédio (...)'
(...) ' não podendo resistir de pé uma vez que se façam as valas de fundação da casa que estão construindo os requerentes. Nas condições atuais não ameaça perigo a referida parede, porém, logo que sejam iniciadas as fundações contíguas à mesma parede, fica sem segurança o sobrado onde é estabelecida a Farmácia'."
[BARBUY, Heloisa. A Cidade-Exposição: comércio e cosmopolitismo em São Paulo, 1860-1914. São Paulo: Edusp, 2006, p.50.]
Ficou acertado entre os proprietários a continuação das obras, com interferência da prefeitura no caso de algum dos imóveis ameaçar ruir.
Em seu mestrado, Braglia (2011) destaca que no início do século XX, para a elite paulistam seguir a moda ia além das roupas e calçados, atingindo também as residências:
"(...) na Paulicéia que se desejava moderna e civilizada, não bastava apenas se vestir com'as 'últimas novidades' vindas principalmente da Europa. Era preciso também incorporar essas novidades dentro das residências., 'vestindo' também as casas e os espaços privados, que agora também deveriam ser mostrados e admirados. Desta forma, encontramos anúncios de estabelecimentos , como a Casa Netter, que comercializava artigos de prata, como faqueiros, lavatórios e conjuntos para chá, jóias e relógios, além de lançar um desafio anunciando que comercializava seus artigos com preços mais em conta que outras casas do ramo.
Por esta razão, ao que tudo indica a aparência passava a ser uma forma de distinção e, para ser considerado elegante e chique, as residências abastadas deveriam compor na sua decoração o luxo e o glamour propagado pelas lojas refinadas da cidade."
[BRAGLIA, Nádia Christina. Paulicéia de ontem: as revistas ilustradas e o viver urbano nas primeiras décadas do século XX. Dissertação - Mestrado em História Social. PUC - SP, 2011.]
Interessante observar, como destaca Barbui (2006), a informação no anúncio de compra através de prestações, similar a um consórcio - "com direito a sorteio" e o preço indicado em moeda estramgeiro. O anúncio conta com a ilustração de um gomil - jarra de água para lavar as mãos. Abaixo, a imagem de um gomil colocado para venda na VM - Escritório de Arte, em 2019, com a seguinte descrição: "Gomil e bacia de metal espessurado a prata, orfèvrerie Gallia, ornados ao estilo e época art Nouveau com reservas em cenas de motivos florais e vegetais. 42 cm de diâmetro, a bacia, e 28 cm de altura, o gomil. Marcas na base inferior, com selo de importação da Casa Netter de São Paulo. França, circa 1900."
Outro gomil, apresentado para leilão, em 2014, na D'argent Leilões, com a seguinte descrição: "WMF Elegante jarro em metal espessurado a prata estilo e época art nouveau. Jarro com feitio facetado decorado com guirlandas de louros. Mesmo padrão de decoração na bacia de grande formato com bordas onduladas. Produzido sob encomenda para Casa Netter em São Paulo. Alemanha, inicio do sec. XX. 40 cm de altura. (algumas falhas no prateamento)".
Além de gomil, a loja oferecia diversos objetos para "vestir" a casa e seus proprietários com elegância e luxo:
Os produtos abaixo, colocados para leilão, são similares aos ilustrados no anúncio de 1914.
Talheres colocados para leilão - Família Rosa Leilões -, em 2021, com a seguinte descrição: "Par de antigos talheres em metal espessurado a prata 90 manufatura Casa Netter, sendo uma colher para sopa e um garfo, apresentam alguns desgastes no banho de prata conforme foto. Medidas aproximadas colher 21 x 4, 5 cm e garfo 21 x 3 cm".
Conjunto com gomil e objetos de toucador, colocados para leilão em 2019, na Began & Marise Domingues, com a seguinte descrição: "Conjunto toucador executado em "pewter" francês, confeccionado para o mercado brasileiro, composto por gomil e sua respectiva lavanda (29 x 26 x 21 cm / 13 x 38 cm), seguido de peças toucador em cristal, encimadas com tampas em pewter, a saber: 2 potes esféricos (11 x 13 cm / 09 x 12 cm), 01 retangular (6 x 12 x 8 cm), 01 frasco (15 cm). Século XIX. Pertencente ao acervo o Dr. Renato de Magalhães Gouvêa. Importado pela Casa Netter - SP. Visível o brasão e o texto "Orfreverrie Gain - nº. 4035". França, início do séc. XIX".
Os produtos em "pewter", estanho, eram anunciados na época como "confeccionados em novos metais" , ou o "Metal Galia" como "único comparável à prata" (OLIVEIRA, 2009), mas, com preços inferiores aos de prata, tornando as peças "acessíveis às fortunas modestas e figurar em outras partes além dos apareadores milionários" (BARBUY, 2006, p.149).
"O mecanismo das imitações - a produção daques objetos então qualificados como 'de fantasia' - passou a valer para vários tipos de artigos destinados ao consumo privado de uma camada social com condições financeiras suficientes para alimentar um modo de vida burguês, em grande parte ostentatório e exibicionista, que funcionava como modelosocial para as fortunas em ascensão.
(...)
A publicidade atraiu o consumidor ávido de cercar-se do reluzente aparato material que o tornaria mais próximo do mundo industrializado e matricial que lhe servia de referência mental e comportamental."
[BARBUY, Heloisa. A Cidade-Exposição: comércio e cosmopolitismo em São Paulo, 1860-1914. São Paulo: Edusp, 2006. p.149-150.]
Os anúncios da Casa Netter também eram publicados em jornais de língua estrangeira, como o Nippak Shimnun:
A CIGARRA, n.2, 30 Mar. 1914.
BARBUY, Heloisa. A Cidade-Exposição: comércio e cosmopolitismo em São Paulo, 1860-1914. São Paulo: Edusp, 2006.
BRAGLIA, Nádia Christina. Paulicéia de ontem: as revistas ilustradas e o viver urbano nas primeiras décadas do século XX. Dissertação - Mestrado em História Social. PUC - SP, 2011.
NIPPAK SHIMBUN, n.1043, 29 Ago. 1936.
NIPPAK SHIMBUN, n.1045, 5 Set. 1936.
O PALCO ILUSTRADO, n.1, Jun. 1908.
OLIVEIRA, Milena Fernandes de. Consumo e cultura material: São Paulo"Belle Époque" (1890-1915). Tese - Doutorado em Desenvolvimento Econômico. UNICAMP - Instituto de Economia, 2009.
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